sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Gênero, adolescências e prevenção ao HIV/aids



O advento da aids e sua íntima relação com os estudos da sexualidade humana
apontam para a importância das questões de gênero para o sucesso da prevenção diante da
epidemia. O enfoque fortemente centrado no uso do preservativo masculino evidencia que,
além do conhecimento sobre o corpo e a sexualidade, relações de poder entre homens e mulheres
precisam ser redimensionadas para que as estratégias que privilegiam o sexo seguro possam ser
incorporadas no cotidiano das relações sexuais. Este artigo, fruto de pesquisa realizada entre
adolescentes de ambos os sexos, com idades de 17 e 19 anos, na cidade de Curitiba, ajuda-nos
a entender como elas/eles pensam a sua sexualidade e a prevenção da infecção pelo HIV,
indicando em que situações vivenciam comportamentos de prevenção e quando negligenciam
diante da sua condição peculiar de vulnerabilidade.


Depois da revolução sexual dos anos 1960 e 1970, sem dúvida, o advento
da aids entre as doenças sexualmente transmissíveis – DSTs —, vem mobilizando novas posturas e diálogos entre as diferentes áreas do conhecimento. Umdos campos mais afetados é o das políticas públicas para a adolescência e a
juventude, no que tange à educação, à saúde sexual e reprodutiva, pois, conforme pesquisas publicadas nos últimos anos, a aids assume dimensões de uma
pandemia. Em 1998, conforme veiculado pela UNAIDS (1999), falava-se que na
América Latina e no Caribe, aproximadamente 65 mil indivíduos entre 15 e
24 anos de idade adquiriram o HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana).
Dados divulgados pela UNESCO (2002) estimavam que aproximadamente
um terço da população mundial se encontrava entre os 10 e os 24 anos de
idade. Segundo a Organização Mundial da Saúde, é nessa faixa etária que se
concentra metade das infecções pelo HIV em todo o mundo. Esses dados evidenciam a situação crítica que se apresenta, priorizando que a população jovem
seja colocada no topo da pauta de debate público sobre as políticas de saúde e
educação, em resposta à epidemia de HIV, no Brasil e no mundo.
De acordo com o relatório denominado Situação da População Mundial, do
Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, 2003), temos mais de 1,2
bilhão de adolescentes com idade entre 10 e 19 anos. Destes, 87% vivem em
países em desenvolvimento. O relatório aponta os principais problemas enfrentados por esses/as jovens, como pobreza, dificuldade de acesso à educação e
doenças. E, entre as doenças, a aids: a cada 14 segundos, um/a jovem é infectado/
a, isto é, todos os dias, seis mil jovens são contaminados pelo vírus da aids, o
HIV. A aids atinge mais as garotas que os rapazes – são 7,3 milhões de jovens
mulheres vivendo com o HIV e 4,5 milhões de rapazes. Por características
biológicas, o risco de infecção numa relação sexual sem proteção é de duas a
quatro vezes mais alto entre as mulheres. Na América Latina e no Caribe estima-se que 560 mil jovens vivam com o HIV.
Segundo o site http://www.adolesite.aids.gov.br, criado pelo Ministério da
Saúde para ajudar as/os adolescentes com informações sobre questões sexuais, o
último Boletim Epidemiológico – Aids – (Brasil, 2007) ali divulgado, publicação trimestral do Ministério da Saúde, registrou, desde o início da década de
1980 até dezembro de 2007, 474.267 casos de aids no Brasil. Deste total,
10.337 casos de aids estão entre as/os adolescentes na faixa etária dos 13 aos 19
anos.
Dados do Ministério da Saúde, até dezembro de 2007, revelam que, na população entre 13 e 24 anos, o número de casos acumulados de DST/aids é de
54.964, dos quais 31.355 adolescentes e jovens do sexo masculino e 23.609 do
sexo feminino (Brasil, 2007), indicando nitidamente uma questão de gênero
1os fatores de vulnerabilidade
2
 e prevenção
3
. Além de as/os adolescentes iniciarem
a vida sexual mais cedo, aliam a isso a desinformação, a prática do sexo
desprotegido
4
 e a escolha imatura do/a parceiro/a.
Compreender o comportamento do/a adolescente no contexto de sua sexualidade – paradigmas comportamentais, afetivos, cognitivos – e trabalhar com
essa população em tempos de aids sob a perspectiva de gênero diante da prevenção foi o que motivou a pesquisa que dá suporte a este artigo, como uma das
contribuições da educação para o enfrentamento da epidemia da aids entre
adolescentes e com novos subsídios às diretrizes de educação sexual, de forma a
promover no/a adolescente senso de auto-eficácia, tomada de decisão, responsabilidade e compromisso de saúde para com a sua própria sexualidade.
Sobre esse objeto de estudo temos as seguintes premissas:
1. as características individuais concernentes a questões de gênero, a iniciação sexual precoce, a competência verbal, a habilidade em planejar o
futuro, a variáveis familiares, a pressões grupais, a auto-estima e outras,
podem predispor a/o adolescente a comportamentos sexuais que a/o coloquem em maior vulnerabilidade;
2. as representações de prevenção manifestas pela/o adolescente e que determinam sua conduta preventiva variam em função do gênero (feminino ou masculino): no feminino, estão mais atreladas às questões do
envolvimento emocional (não planejamento); e, no masculino, às realizações sexuais (prazer) e desempenho em si.
3. as manifestações do egocentrismo descrito por Piaget (1969; 1976) e
retomado por Elkind (1975), o qual estaria relacionado à não-adoção de
medidas preventivas em relação às práticas sexuais, pela falta de tomada
de consciência sobre o risco são observadas na adolescência;
4. a adoção de conduta preventiva no experienciar da sexualidade dos/as
jovens adolescentes não se efetiva mediante educação sexual que se concentre apenas na transmissão de informações científicas, sem que se promova compreensão emocional da sexualidade e senso de autoconsciência
real;
5. a consciência da necessidade de prevenção vai se tornando mais efetiva
com o desenvolvimento cognitivo do/a adolescente.

Nesse sentido, é mister para os/as educadores/as apreender as percepções
que o/a adolescente tem da realidade em que vive. Para mudar o comportamento é importante reconhecer o objeto, atribuindo-lhe assim um valor. Tal
valor é que facilitará a adoção de novas atitudes e de práticas de prevenção.
Em um país de dimensões continentais e clivagens tão desiguais como o
Brasil, a resposta à epidemia do HIV/aids na adolescência passa, necessariamente, pelo enfoque intersetorial – saúde e educação –, abrangendo as esferas
da estrutura governamental e a sociedade civil organizada.




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